domingo, 14 de setembro de 2008

... assim tão Martha Medeiros!

com uma ilustração de Bebel para dar o clima certo

Domingo, dia de ler jornal com calma e, como muitas vezes ocorre, ser brindada com uma comunhão de sentimentos com a Martha Medeiros.
Não sou sua fã incondicional, tanto que ser Martha Medeiros é uma brincadeira, uma expressão que eu cunhei quando a perfeição na imperfeição parece exagerada, algo parecido com o velho "c.i.g." (culta+inteligente+gostosa).


Mas, retornando ao jornal de hoje, seu texto, O sempre no nunca, inicia assim:

"Vivemos num mundo de variados prazeres mundanos, sensoriais, transcendetais, mas poucos tão valiosos quanto ler um livro bom."


Ler...
Verdadeiramente - ler, para mim, vai além do prazer: beira o vício...
Nesses dias mais leves, leio tão intensamente que apenas me faltam mais livros.
E, certamente, vou dar um jeito de conseguir esse "A elegância do Ouriço", de Muriel Barbery, que Martha comenta aqui.

Entretanto, foi o final de sua crônica que comprou minha alma hoje:


"(...) Diante da do dilacerante, o que buscar? O belo. Diante do impossível, diante de uma vida inútil, diante daquilo que não aconteceu nem acontecerá, o que nos compensará? Um único instante sublime. Em todo 'não', há um filete de 'sim'. Em toda descrença, há uma possibilidade de certeza. É o que a autora chama no livro de 'o sempre no nunca'. Basta a lembrança de um piano que tocava em determinado momento de angústia, basta um pedaço de pano colorido que se destacou na hora de reunir as roupas de um morto, basta uma frase especial de uma amiga quando a noite prometia ser um suplício, e nossa desilusão eterna se atenua. Para a maioria das pessoas, os dias correm e parece que os sonhos nunca se realizarão. Nunca. Mas em meio a esse nunca, há de ter um pedacinho afetivo de sempre. Aquela lembrança, aquela foto, aquela música, aquele instante que ficou alheio ao tempo, imortal. O sempre no nunca. Há em tudo, basta um pouco de doçura para reconhecê-lo."


... em meio a esse nunca, há de ter um pedacinho afetivo de sempre!


Como não tê-lo, me pergunto?
Todo dia encontro aquela letra tão familiar escrita num caderno, num papel perdido. Aquele garranchinho de canhoto, por mais bonitinha que sua letra fosse... às vezes consigo sorrir, às vezes dói (apenas quando a encontro planos escritos, planos que nunca foram postos em prática).

Daquelas letras vêm músicas, frases carinhosas ou críticas, cores que foram embora no vento com ela. Mas a lembrança sempre está aqui, o sempre no nunca...

E é essa lembrança que mais me cobra ir em frente e fazer tanto, tantas coisas das quais nem tenho coragem de pensar maior parte do tempo. Assim como sei que já teria lhe tirado a paciência há muito tempo e que algumas de minhas escolhas seriam severamente dissecadas em busca de covardias arraigadas.

Existem sonhos que jamais serão realizados, mas às vezes existe também a realização deles em coisas tão pequenininhas e insignificantes que deixamos passar despercebidas.
Talvez um nunca no sempre, algo inesperado naquilo que conhecemos de cabo a rabo. Algo que nos guia inconscientemente, que nos ajuda a escolher e realizar no próprio irrealizado.
Certamente, seríamos mais felizes se o víssemos com mais freqüência!



Um comentário:

Cacá Ravizzon disse...

Não leve a mal o meu ciúme descarado, mas sempre sinto uma pontinha de inveja ao ver o carinho com que sempre falas da Camila, parece-me que nunca chegarei aos seus pés... Porém, superado este, acho que posso te dizer que estás escrevendo muito bem e que, se continuares assim, quiçá, viras Martha Medeiros também... Umas saudades...